Este ano não houve Verão. Ou melhor, para também não ser tão drástica, este ano o Verão foi curto, muito curto.
Não é que tivesse menos dias que os outros Verões.
E também não é por já estarem dias de chuva e vento, típicos do Outono, mesmo sem ainda o serem.
Mas para mim o Verão foi praticamente inexistente este ano. Pelo menos pessoalmente senti-o dessa forma.
Foi uma altura tão desejada durante todo o passado Inverno, dadas as condições atmosféricas que se verificaram, e em que ansiava verdadeiramente dias de sol e calor, propícios a serem aproveitados da melhor forma.
Praia, esplanadas, saídas com os amigos, petiscadas, ver o pôr do sol, acima de tudo relaxar, descontrair, tudo o que o imaginário simbólico do Verão nos representa e permite fazer.
Sei que está tudo na forma como perspectivamos as coisas, está tudo na nossa cabeça. Porque a praia está lá, as esplanadas também, e apesar de muitos dizerem que o tempo não esteve no seu auge, até houve muitos dias realmente bons, dignos de Verão.
Mas o Verão está essencialmente dentro de nós, bem como o espírito de Verão que esta época do ano nos incute. E talvez isso mesmo não tenha havido Verão para mim. Passei do fim de Primavera automaticamente para o Outono.
O tempo intermédio e tão ansiado entre estas duas estações, ficou bloqueado para mim. Senti-me dormente enquanto ele passou, quase que embalsamada numa tentativa frustrada e angustiante de o querer aproveitar, apesar de titânicos esforços sem sucesso.
Talvez por o Verão ter coincidido com uma altura de transição. Talvez pela inquietação que me tem assolado aos mais variados níveis. Talvez pela necessidade que as coisas tomem um rumo diferente, sigam outro caminho, diferente do anterior.
É todo um conjunto de transformações internas que são o sintoma de que algo tem de mudar, que as coisas tem de tomar outro rumo, simplesmente por não estar confortável no que estava a seguir.
E daí no fim de Primavera, início de Verão ter decidido romper, terminar com o ciclo que já se arrastava lenta e agonizantemente. Diversos factores contribuíram para a decisão dessa ruptura, que não foi por acaso. Nada é por acaso.
Talvez eu achasse que essa ruptura apenas se devia um factor, mas na verdade, muitos outros estavam a contribuir para isso.
E apenas depois nos apercebemos de toda a montanha que se foi avolumando nas nossas costas. Só quando nos voltamos para trás é que realmente vemos a imensidão que se erigiu e que carregamos connosco. Daí o fechar de uma porta.
E portanto, fechou-se um ciclo, terminou.
A vida é feita de ciclos, apenas temos de reconhecer que todos eles começam e acabam, e apenas temos de aceitar isso como normal.
E entre ciclos existem épocas de transição. As alturas de tomar novos rumos, novos caminhos, novas direcções, fazer novas escolhas e decidir novas rotas por onde trilhar.
Mas também é nessas alturas que nos sentimos meio dormentes, sem saber muito bem o que fazer e como fazer. Quase que a maior dificuldade é operacionalizar. Sentimo-nos bloqueados de todos os lados, um bocado incapazes de agir, sem saber muito bem que direcção tomar, ou como tomar.
Por um lado queremos desesperadamente fazer algo, ir, fazer, agir, mexer, mudar as coisas. Temos ideias, planos, projectos, sonhos que gostariamos de ver concretizados. E por outro temos a falta de mecanismos para operacionalizar a mudança, saber como fazer, por onde começar, qual o caminho certo a tomar, e se esse é um intermédio para outro ou já o final, e todo um conjunto de dúvidas, questões, interrogações às quais não sabemos a resposta, e que nos fazem ficar mais retraídos em relação a como processar qualquer avanço.
E apesar de se ter fechado um ciclo nuns aspectos, que está totalmente encerrado no passado, e de se ter iniciado recentemente outro, a sensação de transição ainda é latente.
Até porque desconfio que este ciclo que agora se iniciou também faz parte da transição e na verdade não é ainda o início do próximo grande ciclo...
Porque ainda persiste aquela inquietação, aquela vontade de querer mudar algo, aquela ânsia de fazer qualquer coisa diferente, que valha de verdade esta jornada pela vida, algo que nos estimule, a procura por algo que nos faça descobrir a nós mesmos, e sentir-nos realizados.
E
é toda esta luta, confusão interna, este turbilhão de pensamentos,
ideias, ânsias, desejos, e muito mais coisas que nem sei como explicar e
como me expressar, porque também parece que os mesmos me bloquearam a
escrita.
E a vontade de, já que se saiu de um ciclo, querer-se entrar noutro, não perder tempo. Porque o tempo é valioso. E já que fui eu que determinei o fim de um ciclo, ele não se fechou naturalmente, a busca, a vontade e a ansiedade do próximo, causaram todos estes pensamentos conturbados e turvos. Isto também não permitiu nem permite muitas vezes agir com clareza e total certeza de tudo, até porque é mesmo um período de incertezas e dúvidas, que parece que nunca mais conseguimos ver a resposta.
E é por todo este estado de transição, dormência, impasse, decisão, mudanças, transformações, e tantas coisas que nem sei quantificar nem indentificar, ter coincidido com o Verão, que este se afigurou inexistente para mim.
Talvez porque procurava algo digno de Outono, ao ponto de nem ter conseguido aproveitar o Verão. Talvez tenha sido por estar tão ocupada a tentar redifinir metas e delinear estratégias, que o Verão se evaporou aos meus olhos e eu nem o vi. Talvez por estar tão focada no planeamento de um novo ciclo que nem consegui aproveitar dignamente o que a estação do ano me podia oferecer. Talvez pelo receio de agir tarde demais e pela ânsia de conseguir algo novo, nem dei pelo Verão passar diante de mim.
Talvez tenha sido por tudo isto. Talvez. Nem eu sei ao certo.
Só sei que é um estado de dormência que nos imobiliza os movimentos e, de certa forma, também os pensamentos.
E foi por tudo isto coincidir com o Verão, que o Verão foi estranho. Passou ao lado, e quase não dei por ele, nem tive provas de que realmente ele existiu.
Pensamentos turvos podem nublar um dia de sol...
2 comentários:
Mas virão muitos Verões mesmo que chova ou faça frio... muitos Verões...
de vez em quando venho espreitar o k escreves ;)
este texto tocou me particularmente, tocou me porque essa confusao de pensamentos turbilhao de projectos e o nao saber como os concretizar tambem me frustra. Mas acho que faz parte do processo, nao nos podemos queixar desse estado de espirito mas sim aceita-lo e acalma-lo para ver mais claramente.
abraço
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