28 junho 2014

Eu adoro Voar...


Já escondi um amor com medo de perdê-lo, já perdi um amor por escondê-lo.
Já segurei nas mãos de alguém por medo, já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos.
Já expulsei pessoas que amava de minha vida, já me arrependi por isso.
Já passei noites chorando até pegar no sono... e já fui dormir tão feliz, ao ponto de nem conseguir fechar os olhos.
Já acreditei em amores perfeitos, já descobri que eles não existem.
Já amei pessoas que me decepcionaram, já decepcionei pessoas que me amaram.
Já passei horas na frente do espelho tentando descobrir quem sou... já tive tanta certeza de mim, ao ponto de querer sumir.
Já menti e me arrependi depois, já falei a verdade e também me arrependi.
Já fingi não dar importância às pessoas que amava, para mais tarde chorar quieta no meu canto.
Já sorri chorando lágrimas de tristeza, já chorei de tanto rir.
Já acreditei em pessoas que não valiam a pena, já deixei de acreditar nas que realmente valiam.
Já tive crises de riso quando não podia.
Já quebrei pratos, copos e vasos, de raiva.
Já senti muita falta de alguém, mas nunca lhe disse.
Já gritei quando deveria calar, já calei quando deveria gritar.
Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns, outras vezes falei o que não pensava para magoar outros.
Já fingi ser o que não sou para agradar uns, já fingi ser o que não sou para desagradar outros.
Já contei piadas e mais piadas sem graça, apenas para ver um amigo feliz.
Já inventei histórias com final feliz para dar esperança a quem precisava.
Já sonhei demais, ao ponto de confundir com a realidade...
Já tive medo do escuro, hoje no escuro "me acho, me agacho, fico ali".
Já cai inúmeras vezes achando que não iria me reerguer, já me reergui inúmeras vezes achando que não cairia mais.
Já liguei para quem não queria apenas para não ligar para quem realmente queria.
Já corri atrás de um carro, por ele levar embora, quem eu amava.
Já chamei pela mãe no meio da noite fugindo de um pesadelo. Mas ela não apareceu e foi um pesadelo maior ainda.
Já chamei pessoas próximas de "amigo" e descobri que não eram... Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais para mim.
Não me dêem fórmulas certas, porque eu não espero acertar sempre.
Não me mostrem o que esperam de mim, porque vou seguir meu coração!
Não me façam ser o que não sou, não me convidem a ser igual, porque sinceramente sou diferente!
Não sei amar pela metade, não sei viver de mentiras, não sei voar com os pés no chão.
Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma para sempre...
Gosto dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais poderosas, das ideias mais insanes, dos pensamentos mais complexos, dos sentimentos mais fortes.
Tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos.
Podem até empurrar-me de um penhasco que eu vou dizer: E daí? Eu ADORO VOAR...
 
Clarice Lispector


07 junho 2014

Pessoas grandes...


"Tenho boas razões para pensar que o planeta de onde o principezinho vinha era o asteróide B612. Este asteróide foi visto ao telescópio uma única vez, em 1909, por um astrónomo turco.
Nessa altura, o cientista apresentou uma grande exposição da sua descoberta a um Congresso Internacional de Astronomia. Mas ninguém o levou a sério por causa da maneira como estava vestido. As pessoas grandes são assim.


Felizmente que, para boa reputação do asteróide B612, um ditador turco se lembrou de impor ao seu povo, mas impor-lhe sob pena de morte, que passasse a trajar à europeia. 
O astrónomo voltou a fazer a sua demonstração em 1920, mas agora muito bem posto. E toda a gente a aceitou.

 
Só vos contei tudo isto sobre o asteróide B 612 e só vos confiei o seu número por causa das pessoas grandes. 
As pessoas grandes gostam de números. Quando vocês lhes falam de um amigo novo, as suas perguntas nunca vão ao essencial. Nunca vos perguntam: "Como é a voz dele? De que brincadeiras é que ele gosta mais? Ele faz colecção de borboletas?". 
Mas: "Que idade é que ele tem? Quantos irmãos tem? Quanto é que ele pesa?  Quanto ganha o pai dele?". 
Só assim é que pensar ficar a conhecê-lo. 

Se vocês disserem às pessoas grandes: "Hoje vi uma casa muito bonita de tijolos cor-de-rosa, com gerânios nas janelas e pombas no telhado...", as pessoas grandes não a conseguem imaginar.
É preciso dize-lhes: "Hoje vi uma casa que custou 20 mil contos". Então já são capazes de exclamar: "Mas que linda casa!" " 

em "O Principezinho", Antoine de Saint-Exupéry